23 outubro 2010

Lua Cheia de Outubro

"(...) dizia que o cabelo de uma mulher é a rede onde Satanás
apanha a alma de um homem. E o cabelo de Gudrun
era extraordinariamente belo, comprido, macio, dourado,
sem um único cabelo branco, apesar de já ser uma idosa
com trinta e seis primaveras. (...)
Aceitavam o que lhes diziam e não procuravam ir mais além.
Sonhavam com um bom marido, quer dizer, um homem que
as tratasse bem e que não lhes batesse, e com um pedaço de
terra para cultivar; nem sequer pensavam em sair do mundo
seguro e familiar da aldeia. Eram tão incompreensíveis para
Joana como ela para elas. (...)
Se Hrotrud viesse à superfície e flutuasse revelar-se-ía como
uma feiticeira e como uma bruxa, pelo que seria queimada.
Se se afundasse, estava provada a sua inocência (...)
- Aprende com o meu erro -  disse Gudrun firmemente - para
não o repetires. Casar é abdicar de tudo; não só do teu corpo,
mas também do teu orgulho, da tua independência, da tua
própria vida. Percebes? (...)
A semente da dúvida, plantada na infância pela sua mãe,
tinha criado raízes na sua alma. (...)
Nunca te entregues a um homem. A voz da sua mãe ecoava
como um sino de alarme na sua cabeça.
Precisava de tempo para distinguir o turbilhão de emoções que
lhe iam no coração. Mas tempo era coisa que ela não tinha. (...)
ficou súbita e irracionalmente zangada com Geraldo por ele ter
despertado nela aqueles sentimentos. (...) Dava largas à cólera
que sentia dentro de si, esperando que ela reprimisse as suas
outras emoções, mais perigosas. (...) Joana não queria ouvir
argumentos razoáveis. A proximidade de Geraldo e a atracção
física que sentia por ele eram um tormento, uma serpente que
se enrolava à volta da sua vontade, estrangulando-a. Tentou
libertar-se do seu abraço com brusquidão. (...) Mais uma
palavra de amor e de desejo da parte dele, e ela cederia e
correria para os seus braços. Mas ele virou-se de repente e
afastou-se na direcção da porta. (...)
Sorriram um ao outro com o calor da intimidade restabelecida.
(...) - Cada vez que te vejo...volto a descobrir-te. (...)

Mente e coração, fé e dúvida, vontade e desejo. 
Será que as dolorosas contradições da sua 
natureza alguma vez se resolveriam?"

[Livro "A Papisa Joana" de Donna Woolfolk Cross]

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